sábado, 10 de janeiro de 2015

Retrospectiva

Num quarto de hotel, com tudos os pertences a caminho de Lisboa, faço um balanço dos três anos que passei no Brasil.

Em três anos aprendi o que é ser a estranha, a estrangeira, num outro país: lidar com piadas, gracinhas, e fazê-lo de cabeça erguida, com riso fácil e noção de que algumas são merecidas, e outras não, e essas há-que ignorar e esquecer que foram ditas.

Aprendi a cantar, a viver para a música, e dela tirar o maior prazer da vida. O canto me trouxe algumas das melhores experiências deste ano: viagens, concertos, gravações. Nunca me senti tão útil, tão apreciada, e tão realizada.

Aprendi a apreciar o momento, viver a vida no aqui e no agora, com as pessoas que estão presentes. Nada nos obriga a esquecer as que estão longe, se elas não se esqueceram de nós. Mas não podemos ficar presos à saudade, nem ao medo, nem ao acanhamento. 

Aprendi que o pior, é não tentar. É ficar para sempre nos perguntando "e se?...". Aprendi que às vezes 2 segundos de coragem valem a pena. Este ano estou a pôr em prática esta mesma teoria. E aprendi também que com tentativas vêm erros, que têm de ser admitidos, analisados e superados. Thomas Edison disse das tentativas falhadas da lâmpada: "eu não falhei. Eu só descobri 10,000 maneiras que não funcionam." E é isso a vida: uma sequência de tentativas e falhas e acertos.

Aprendi que o mundo está cheio de problemas. Que há 1,001 discussões para se fazerem, e que só não as conhecem quem nunca teve os seus olhos abertos para o mundo. Acredito agora que é função da escola não apenas ensinar a gramática, e a geografia, e a matemática, e a história, e a educação física, como também a actualidade - a geopolítica, as religiões, a sociologia. Percebi que é necessário discussão, debate, abrir olhos e chocar mentalidades para acordar todos para os problemas que se passam no mundo. Há 3 anos eu não discutia política. Eu não conhecia a presença do racismo no mundo ainda hoje. Eu tinha uma leve ideia do machismo no mundo, mas não conhecia o feminismo - e só não o apoia quem não o compreende.

Aprendi que é importante nos abrirmos à felicidade. À felicidade em gostar daquilo que gostamos. À felicidade que se encontra num bonito pôr-do-sol, no vento num dia quente, no autocarro que chega ao mesmo tempo que nós à paragem. Antes ofendia-me por me chamarem nerd. Hoje sou-o com orgulho. Nerd não é marrão. Nerd é apaixonado. Nerd é fã. E eu sou fã. Eu sou fã de muita coisa, e fico feliz quando vejo/leio/oiço aquilo de que gosto. E agora sou feliz por ser assim: apaixonada ao invés de impassiva. Emotiva ao invés de fria. Eu me permito ser do jeitinho estranho e nerd que eu sou, e sou feliz.

Acima de tudo, aprendi a viver de maneira diferente. A me adaptar e a me preservar, também. Aprendi costumes novos e ensinei e mantive os meus. Celebrei a festa Junina e o Santo António, o Dia dos Namorados em Agosto e em Fevereiro. Tornei-me passeante de shopping também, e amante da Avenida Paulista. A "pegar" o "metrô", mantendo a mochila na frente do corpo, e o "ônibus" até casa "no ponto", que dura duas horas e meia de caminho. A lidar com filas em todo o lado, seja na Bienal ou no pagamento do estacionamento, na exposição no MASP e no drive-in do McDonald's.


Em três anos aprendi tanta coisa. Aprendi tanto sobre mim e sobre o mundo. Mas 2015 traz ainda mais surpresas, mais ensinamentos, mais descobertas. Ou assim o espero, porque ainda me falta aprender tanto.
Mariana

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